300 anos de história e cultura em risco
A Quinta do Torneiro, também conhecida por Quinta de Nossa Senhora dos Anjos, terá sido construída no início do século XVIII. É constituída por uma casa senhorial, jardins de buxo, uma capela exclusiva, clássica, decorada com azulejos portugueses que retratam algumas passagens bíblicas, um altar em talha dourada, uma imagem central de Nossa Senhora dos Anjos, e propriedade agrícola. Foi construída no meio da natureza, ladeada por campos agrícolas e de pasto, garantes do sustento da família e dos empregados da propriedade.
O Movimento “Evoluir Oeiras” considera que a Quinta do Torneiro está ameaçada pelo Plano de Pormenor Norte de Paço de Arcos, promovido pela Câmara Municipal de Oeiras, abrangendo toda a parcela da mesma para construção de mais escritórios e alguma habitação.
Aliás, é a própria Câmara Municipal de Oeiras, pela mão da então Presidente da Câmara Teresa Zambujo que assumia a necessidade de proteção deste espaço, já que a Assembleia Municipal de Oeiras aprovou a 2 de Dezembro de 2003, mediante proposta da Câmara tomada em reunião ordinária, datada de 29 de Outubro de 2003, o Regulamento do Plano de Salvaguarda do Património Construído e Ambiental do Concelho de Oeiras de 1999, que no seu artigo 12º, a classifica como “antiga quintas de recreio, (…) mantêm a sua estrutura arquitetónico-paisagística quase intacta. A sua importância em área, carga histórica e valor arquitetónico e ambiental permite definir para estas quintas de recreio o grau A.”.
Onde está este documento no tal falado planeamento estratégico de “Oeiras Capital Europeia da Cultura 2027? E no PDM de 2015?
Perdeu-se? Terá sido revogado por Oeiras Valley? Quando? Porquê?
Para qualquer município, e para Oeiras já o foi como ficou provado acima, a presença deste território histórico seria visto como uma oportunidade. Em “Oeiras Valley” parece ser apenas um empecilho ao “progresso”, um obstáculo a demolir em 2 dias pelas “bulldozers”.
Admite-se, entre o muito que pode ser feito, que as antigas habitações de características militares existentes em redor da Quinta do Torneiro, sejam reabilitadas para habitação.
Apostar na recuperação ao invés de construir de raiz, sem destruir o já existente enquadramento residencial e salvaguardando o património urbano, ambiental e agrícola da zona.
Os terrenos envolventes são solos férteis, já que não só eram abastecedores da Quinta do Torneiro como serviam para os mercados da cidade de Lisboa
As obras de novas construções vão interferir com o curso da Ribeira de Porto Salvo (cujas mães d’água estão interligadas às da Serra de Carnaxide e ao Aqueduto que abastecia Lisboa). Sem um plano cuidado, vislumbramos mais um atentado ambiental e um desrespeito ao património histórico e cultural que coloca em risco desde a quinta ao seu arvoredo exuberante, até o curso de água que atravessa a própria Quinta.

História e Cultura: O que se sabe da Quinta do Torneiro?
Em 1734 pertenceu a Feliciana Teresa da Mota, mas não há mais registos que permitam chegar a quem seria esta personalidade. Mais tarde, depois da sua morte, a propriedade fez parte dos bens da Santa Casa da Misericórdia de Santarém.
Consta que a Quinta do Torneiro terá sido oferecida ao Bispo confessor de D. Maria Pia de Saboia, esposa do Rei D. Luís, de 1862 até 1889. D. Maria Pia tinha como residência oficial o Palácio da Ajuda e como residências de recreio o Palácio da Vila, em Sintra e um chalé no Estoril. Assim a Quinta do Torneiro ficaria a meio caminho entre o Palácio da Ajuda, Sintra e o Estoril.
No início do século XIX, foi adquirida por Freitas Guimarães de Vasconcelos, contador-mor do reino.
Anos mais tarde, António Izidoro (Isidro?) da Costa, 1º Visconde de Porto Salvo, herda a Quinta por via materna. A sucessão passa então para o seu sobrinho, José Viana da Silva Carvalho, avô dos atuais proprietários e agora utilizada para organização de festas e de casamentos.
Fonte pública do Canejo e portão da Quinta do Torneiro
Fonte do Canejo, conhecida atualmente por Chafariz do Canejo, onde se encontra a inscrição: “António Isidro da Costa o mandou fazer à sua custa no ano de 1822”. Do lado direito, observamos um portão em ferro forjado que é a entrada para a Quinta do Torneiro. Na parte superior do portão, está um medalhão em ferro forjado, com as iniciais: A.I.C. e a data de 1820.
Vinte anos depois, em 1840, sabemos que António Isidro da Costa vivia nesta quinta, pelo seu registo de testamento: “Registo nº 23, relativo ao testamento de António Isidro da Costa, morador na Quinta do Torneiro no Lugar de Porto Salvo, Freguesia de Oeiras aprovado em 1840-05-15 pelo Tabelião António Simão de Noronha, e registado e copiado para o livro de registo de testamentos pelo Escrivão da Administração do Concelho de Oeiras, Jacinto Vidal Madail”.
Encontra-se ainda esta referência à Quinta do Torneiro no Registo nº 220, em 1869, relativo ao testamento de “Maria do Carmo Chiappi, moradora, na Quinta do Torneiro, no Lugar de Paço de Arcos, Freguesia de Oeiras. Testamento redigido e aprovado em 1869-11-03, pelo Tabelião Teodoro José Francisco da Costa e registado e copiado para o livro de registo de testamentos pelo Escrivão da Administração do Concelho de Oeiras, Jorge Joaquim da Fonseca”.
A quinta tem uma Casa Principal com cerca de 1.700m2 e a restante área, cerca de 1.000m2 dedicada a outras construções habitacionais e conta (ainda) com uma área de 64.000m2 de terreno rústico.
A Casa Principal reflete as principais características das casas nobres do Século XVIII, com os seus tetos altos forrados a caixotões de madeira pintada, tendo os tetos de cada salão de cor diferenciada. Possui salas com painéis de azulejos do século XVIII, alguns considerados raros.
Já as paredes são cobertas de azulejaria do século XVII, com destaque para os azulejos azuis e brancos, com diferentes padrões e temáticas. As várias salas e salões contíguos, podem ser abertos ou fechados conforme as necessidades de espaço. O Salão Nobre, com ricos azulejos de padrão distinto dos demais azulejos da casa, sobressai em relação aos restantes espaços.
Fontes
- Regulamento do Plano de Salvaguarda do Património construído e ambiental do Concelho de Oeiras em https://dre.pt/home/-/dre/3314279/details/maximized
- Arquivo Municipal de Oeiras: Quinta do Torneiro, Código de Referência: PT/MOER/MO/NF/008/000005
- Fonte pública do Canejo e portão da Quinta do Torneiro: Código de Referência: PT/MOER/MO/NF/008/000004, Código de Referência: PT/MOER/MO/NF/008/000003
- Registo de testamento de António Isidro da Costa: Código de Referência: PT/MOER/ACO/NOT/01/001/023
- Registo de testamento de Maria Augusta Chiappi: Código de Referência: PT/MOER/ACO/NOT/01/006/041
- Processo de obra 191:1927 ( 11-03): PT/MOER/MO/URB/08/191:1927
- Imagens do património em https://www.quintadotorneiro-eventos.com/